domingo, 6 de outubro de 2013

FAGULHA DO ROCK NACIONAL

Olá pessoal,vejam a baixo esta reportagem:

FAGULHA DO ROCK NACIONAL

JOTA BÊ MEDEIROS - O Estado de S.Paulo
Não é possível compreender razoavelmente a sintaxe do rock nacional sem ouvir com atenção esse disco, gravado há 30 anos pelo quinteto Barão Vermelho. Remasterizado agora pela Som Livre, Barão Vermelho (1982) reedita todas as faixas originais em nova mixagem e traz uma canção inédita, Sorte e Azar.
Os integrantes originais do grupo regravaram os instrumentos no ano passado, emparelhando um som menos precário à voz de Cazuza, força sobrenatural que era o abre-alas, a poética e a consciência da banda.
Caetano Veloso diz, em texto no encarte, que é seu disco de rock nacional favorito. O mesmo Caetano, na canção Língua, atentava para a especificidade da fala brasileira. "Nós canto-falamos como quem inveja negros/Que sofrem horrores no gueto do Harlem".
Mas Cazuza não invejava negros. Cantava discursivamente o blues e o rock'n'roll com um orgulho carioca invejável. O blues e o Rio de Janeiro, de cara, pareciam elementos destinados a não se misturarem jamais. Havia poucas exceções. Mas, ao contrário de sua madrinha Angela Roro (que canta o blues para se desmaterializar) e de Celso Blues Boy (que tocava o blues para se imantar), Cazuza anunciava um blues eufórico, geracional, furioso. Algo até então inaudito.
Quando apareceu, o Barão Vermelho tinha pinta de banda de playboys que tinha aprendido a imitar uns riffs de Keith Richards na guitarra e uns acordes de Jerry Lee Lewis no teclado. O que os diferenciava? A poética suja de Cazuza, beatnik do Leblon, que incorporava termos de uso corrente, mas tidos como "degenerados" pela legalidade semântica.
"Como pode alguém ser tão demente, porra louca/inconsequente/ e ainda amar, ver o amor/como um abraço curto pra não sufocar?", cantava, em Bilhetinho Azul.
Parece traição histórica regravar todos os instrumentos em 2012, remixando o disco novamente. "Era um trabalho de adolescente", explicou o baixista Dé, da formação original, alegando que aquela precariedade inicial nunca os deixou satisfeitos.
A voz de Cazuza encaixava-se naquela instrumentação ingênua como uma lufada de sinceridade. Ele não era messiânico, não tinha intenção de apontar caminhos para ninguém, apenas escapar salvo e são das balas de quem lhe queria bem - só para citar um artista do mesmo naipe que o precedeu, Belchior. "Da privada eu vou dar com a minha cara/De panaca pintada no espelho/E me lembrar, sorrindo, que o banheiro/É a igreja de todos os bêbados".
Poeta de ambição popular como Noel Rosa ou Cartola, Cazuza vasculhou a alma torta de sua geração com o espírito aberto, sem medo nem preconceito. "Por enquanto cantamos/Somos belos, bêbados cometas/Sempre em bandos de quinze ou de vinte/Tomamos cerveja/E queremos carinho/E sonhamos sozinhos/E olhamos estrelas/Prevendo o futuro/Que não chega".
A sua saga particular pelo mundo, que seria breve e intensa, eternizaria o meteoro do rock de seus parceiros Frejat, Dé, Guto Goffi e Maurício Barros.



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